sexta-feira, fevereiro 13, 2009

Entrevista com Alex Primo: nossos alunos tem um perfil diferente de anos atrás

No Blog de Alex Primo ou no próprio Jornal Zero Hora (que publicou a entrevista ontem, 12/02/09), pode-se ler a entrevista que reproduzo logo abaixo.
Apesar de Primo não ter dito isso, o jornal chegou a conclusão que nossos alunos não tem mas capacidade de concentração para sentar e ouvir.
Me parece que o que é posto em questão, no atual contexto, é o que se espera de uma aula: uma palestra? o despejo de um volume enorme de informação? se fosse isso, aí faria sentido esperar que o aluno ficasse horas sentado e ouvindo.
Mas, como vários autores já nos fizeram entender, o processo de aprendizagem é um processo ativo, sendo que para o qual o aluno deve ser considerado como um sujeito ativo. A aprendizagem, quando significativa, não é um processo passivo.
Me admira que, em tempos onde todos fazem várias coisas ao mesmo tempo, quando os fluxos (de informação, dos negócios, ...) são cada vez em maior volume e mais rápidos, quando dependemos mais do desenvolvimento tecnológico do que dos nossos próprios genes para nossa sobrevivência, quando o livre acesso a informação alavanca a produção descentralizada de produtos informacionais, me admira que um jornal conceituado como este ainda reproduza com espanto a afirmação: "alunos não querem sentar e ouvir"!!!

Neste quadro chegamos nos conteúdos, que refletem a concepção de educação que temos, o que acreditamos como o papel do professor, o que esperamos dos alunos. Mesmo os conteúdos digitais, ditos como "inovadores" nada acrescentam se reproduzirem o mesmo ensino tradicional, apenas conteudista, com o aluno simplesmente "olhando". Que tal tentarmos "vestir o conteúdo" e tentarmos criar condições para que nossos alunos (e nós) aprendam com prazer?
[se vc quiser ver um exemplo desse "vestir o conteúdo" veja a postagem de ontem sobre Darwin]




| 12/02/2009 | 02h37min

“O aluno não quer mais se sentar e ouvir”

Entrevista: Alex Primo, doutor em Informática na Educação

Professor do Programa de Pós-graduação em Comunicação e Informação da UFRGS, Alex Primo sustenta que o mundo digital deu origem a um novo padrão de estudante, acostumado ao uso da tecnologia. Para se adequar a esse perfil, escolas e educadores devem rever suas práticas. Confira trechos da entrevista a ZH:

Zero Hora – Qual principal o impacto das novas tecnologias na vida do estudante?

Alex Primo
– O acesso às informações. Antes, a educação era baseada no livro, e os livros eram prescritos pelos professores como a informação que devia ser estudada, onde estavam as respostas. Hoje, mesmo uma criança tem possibilidade de buscar as soluções na internet.

ZH – O que isso muda?

Primo
– Constrói na criança o espírito da investigação. Não é o professor que entrega uma resposta pré-definida. Ela vai atrás para construir suas respostas.

ZH – É um novo aluno?

Primo
– Sem dúvida. Antigamente, falava-se em ensinar. Hoje, é preciso ter preocupação maior com a educação, como um processo global para a aprendizagem e para a produção ativa. O aluno não quer mais se sentar e ouvir, porque ele está acostumado a produzir por meio das novas tecnologias.

ZH – Isso exige uma adaptação na maneira de dar aula?

Primo
– Demanda-se um maior dinamismo nas aulas e a valorização da expressão multimídia: usar fotos, sons, textos em blogs para os estudante poderem valorizar aquela linguagem que eles conhecem. Se não se fizer isso, fica um hiato muito grande entre linguagem do aluno e do professor.

ZH – Os jovens de hoje têm menor capacidade de concentração?

Primo
– Uma vez escutei que havia professores que ensinavam em blocos de 15 minutos e contavam uma piada, para seguir o ritmo da televisão. Agora, percebemos uma mudança, as pessoas se afastando da TV e indo para o computador, onde a dedicação é total. Ficam horas no computador. A diferença é que hoje se navega em muitas janelas ao mesmo tempo. O jovem conversa, navega, vê vídeos, tudo ao mesmo tempo. Então, é uma concentração fragmentada.

ZH – A internet estimula a cópia de trabalhos?

Primo
– O plágio, a cola da enciclopédia sempre existiu. Eu lembro de fazer isso quando criança, vários alunos copiavam informações das enciclopédias, o professor recebia muitas cópias e nem se dava conta. Não é um problema novo, da internet. O interessante é que o aluno comece a reconhecer a importância da consulta às fontes e de valorizar a autoria, não minimizar a importância da busca de informações e citações.


2 comentários:

Jarbas disse...

Oi Adriane,

A entrevista do Alex Primo e suas observações aqui no blog abrem um espaço interessante para conversas sobre comunicação e e aprendizagem.
O ponto central de sua análise, a falta de concentração dos alunos em situações em que conteúdos são apresentados em exposições,merece mais considerações.
O fato, apresentado por Alex e comunicado com certo teor de escândalo pelo ZH, sugere,entre outras,as considerações que seguem:

1. O discurso sitematizado,muito valorizado na cultura grega e na educação clássica (tradicional,se quiserem...), criava demandas intelectuais específicas e formas exigentes de pensamento. Certos avanços na cultura e na ciência foram facilitados pelos hábitos intelectuais desenvolvidos em tal ambiente de comunicação.
2. Escutar,ver,assistir a,e outros comportamentos similares não são necessariamente passivos. Quem escuta não recebe e armazena simplesmente o discurso. Informações recebidas são sempre processadas pelo ouvinte. A leitura do "texto" é sempre uma criação de significados por parte do "leitor".
3. Mudam formas de comunicação. Não mudam as capacidades de aprender próprias de nossa espécie. Estas últimas ganham certos contornos por causa das primeiras,mas o equipamento cognitivo não sofre por isso mudança significativa.

Paro de fazer enunciados com o objetivo de ser breve e fico,por enquanto só no caso do formato expositivo como alternativa de comunicação.Fui aluno de alguns professores que davam ótimas aulas expositivas. Aprendi muito com eles. E escutá-los não era um ato passivo. Pelo contrário. O que expunham fazia pensar, criava desequilíbrios, provocava admiração, despertava interesses, dava sentido ao assunto estudado. Eles,é claro,sabiam fazer exposições que desencadeavam aprendizagens valiosas. Tive também professores que trabalhavam expositivamente e eram um desastre.
Narro sinteticamente um episódio que vivi.Durante a Constituinte estava num depoimento da comissão de educação.Alguém anunciou que numa sala ao lado o Florestan Fernandes iria falar sobre raízes do racismo no Brasil.Fui escutar o velho. A sala estava abarrotada de gente.Florestan fez uma exposição de mais de duas horas. Silêncio total,respeitoso e atento da platéia. Aprendi muito na ocasião. Escutar Florestan Fernandes não era um ato passivo.
Há áreas de conhecimento que se estruturam em discursos sistematizados. Filosofia e História,por exemplo. Não há como aprendê-las sem tais discursos (nos formatos oral e escrito). Dispensar discursos sitematizados,no caso,é dispensar as próprias disciplinas. Por importantes que sejam as imagens no exame de evidências em história,a constituição final do saber se dá na forma de discurso. Qualquer estudo de temas filosóficos é discursivo,exige muita concentração.
No caso de outros saberes, embora não tenha certeza de que a sua constituição seja tão discursiva como no caso da história e da filosofia,acredito que há necessidade de elaboração sistemática e rigorosa de um certo "discurso" que funciona como ferramenta necessária à compreensão. Estou a pensar aqui no caso da física. Parece-me que a comunicação de saberes dessa ciência exige certa discursividade, mesmo que travestida em símbolos matemáticos imcompreensíveis para leigos (exemplos disso são os artigos do meu filho mais novo,físico teórico que estuda certo tipo de eventos no campo da matéria condensada - seja lá o que isto signifique...).
Não estou aqui a defender ensino tradicional ou aulas expositivas. Quero apenas chamar atenção para certos modos de comunicação que não se casam bem com as novas TIC's. Tal circunstância não os desqualifica como modos humanos de aprender. Tal circunstância não nos autoriza a dispensá-los.
A tecnologia dá.A tecnologia tira. Novas formas de comunicação querem mais espaço.E para tanto conquistam espaço antes ocupado pelas velhas formas de comunicação.Estas,porém,não são necessariamente velharias que merecem descanso eterno. São invenções humanas importantes para facilitar determinadas dimensões de saber.
Termino de modo inconcluso,pois acho que é preciso conversar mais sobre o assunto. Seria muito bom, neste sentido, que nossos amigos da blogosfera entrassem na dança e comentassem o assunto.
Abraço grande, Jarbas

Anônimo disse...

Oi!
dás-me autorização para inserir este posto no meu blog? Não me esquecerei de fazer o link e referir os direitos de autor.